Crônica - Aquele Casal...
Certa vez estava passeando por aí e me deparei com uma velha casinha numa esquina de rua, simples, tímida, escondendo-se dentre os enormes prédios que assomavam a região. Parei para observá-la.
Não havia quintal e, como a janela estava aberta, facilmente avistava a aconchegante sala lá dentro. Enquanto observava aquele charmoso ambiente interior, avistei seus moradores: um senhor e uma senhora de, aproximadamente, 80 anos de idade.
O clima lá dentro parecia tenso, pesado, até mesmo desconfortável. A mulher chorava e o homem encostava-se a parede com as mãos na cabeça, como quem absorve a raiva para si na intenção de livrar o outro.
“Você não muda nunca!” Berrou ela.
“Digo o mesmo.” Murmurou seu companheiro, amargo.
Baixei os olhos e segui caminhando. Melhor esquecer o que havia visto...
Passei pelo parque, shopping, pelo enorme teatro e resolvi voltar. A passos largos, temia o momento em que cruzaria com a pequena casinha... O que teria acontecido ao casal? Teriam resolvido se separar no ápice da vida? Afinal, a discussão parecia muito séria.
De repente, o soar de uma música antiga invadiu meus ouvidos. Parei o caminhar instantaneamente e fechei os olhos. Como uma louca, segui a melodia a cegas, forçando meus sentidos para encontrá-la.
Subitamente, o som ficou alto o suficiente para estar soando a meu lado. Dei-me por satisfeita e ergui minhas pálpebras. Tamanha foi minha surpresa que abafei um gritinho de emoção.
Estava parada frente à janela da mesma casinha vista mais cedo. Arquejei.
Hesitante, observei a sala novamente e, para meu completo espanto, deparei-me com o mesmo casal em meio a uma bela dança de valsa, comum no século passado. Um arrepio transpassou minhas costas.
Timidamente, ouvi a mulher sussurrar:
“Você não muda nunca...”
Apaixonado, o companheiro afastou-se um pouco, encarou-lhe os olhos e murmurou: “Digo o mesmo...”